sábado, 7 de agosto de 2010
Mãos que falam: O mercado de trabalho precisa de profissionais de LIBRAS
O intérprete de Libras - a Língua Brasileira de Sinais - está em alta no mercado de trabalho. Qualquer que seja a direção em que olharmos, descobre-se um campo promissor, em expansão e, ainda, pouquíssimo explorado.
O milagre é produzido pelo decreto 5.626/2005, que regulamenta a Libras e a formação educacional do intérprete capacitado a trabalhar com ela. Para entender a importância de seu trabalho é preciso conhecer um pouco da própria Língua Brasileira de Sinais. Suas principais características são a gramática e lingüística próprias e o fato de ela não ser estática - os sinais são incorporados à linguagem de acordo com a necessidade apresentada pela comunidade surda.
Segundo Joel Barbosa Júnior, graduando em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e intérprete na instituição, "havia menos sinais há três anos". De acordo com ele, "certamente haverá muitos mais daqui a três anos". Viva, a língua falada com as mãos tem seu vocabulário enriquecido diariamente - assim como acontece com a Língua Portuguesa.
As condições essenciais para atuar como intérprete é ter domínio da Libras (e também da Língua Portuguesa) e, fundamental, da cultura da comunidade surda e ouvinte - além de boa audição. Sem isso é difícil interpretar corretamente a linguagem oral em sinais. E vice-versa.
É na área de educação que o potencial de desenvolvimento profissional para o intérprete de Libras se mostra mais evidente. Segundo dados de 2005 da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação (MEC), pouco mais de 46 mil surdos estão matriculados na escola, com grande concentração na rede pública. De acordo com informações do Censo 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existiam 796 mil surdos no Brasil com menos ou até 24 anos de idade. Fazendo uma projeção para números de hoje, temos 873 mil surdos nesta mesma faixa etária. Conclusão: o número de matrículas é irrisório, 5% dos surdos em idade escolar.
Com a tomada de consciência da sociedade em relação à educação inclusiva, é de prever que cada vez mais pessoas com surdez freqüentarão o ambiente escolar nos próximos anos. O déficit atual tende a diminuir. A figura do intérprete será cada vez mais necessária para satisfazer a demanda futura.
O presidente da Associação dos Profissionais Intérpretes e Guias-Intérpretes da Língua de Sinais Brasileira do Estado de São Paulo, Ricardo Sander, pedagogo e intérprete de Libras na Universidade Cidade de São Paulo (Unicid) desde 2002, comenta outros aspectos da profissão. "Temos de ter uma postura ética em qualquer ambiente. Na sala de aula, deve-se estar atento a tudo. Ao professor, aos alunos surdos - e ouvintes - e até mesmo ao que acontece externamente. Precisamos interpretar todas as formas de comunicação." Um desses alunos é Roberto Castilho, 25 anos, com surdez profunda de nascença, que não havia tido ajuda de intérpretes até ingressar no curso de engenharia das telecomunicações da Unicid. Sobre a importância deste profissional na sua formação, o estudante é enfático. "Seria impossível o aprendizado sem ele. Sofri muito nos outros níveis de ensino."
Na Vivo, Castilho não conta com intérpretes fixos, mas sempre que necessário, como em reuniões de trabalho, a figura do intérprete é requisitada. Para o o coordenador do Processo Serasa de Empregabilidade de Pessoas com Deficiência, João Ribas, este é um processo irreversível. "Existe um movimento das empresas no sentido de contratar este profissional. Na Serasa, trabalhamos com dois intérpretes que ajudam nossos onze funcionários surdos."
Quanto à remuneração do profissional, existe consenso de que em instituições de ensino ela deve acompanhar a dos professores. Nas empresas, deve ser equivalente a cargo de igual importância. No caso de profissionais autônomos, os valores devem ter como base a remuneração de intérpretes de línguas orais, com carga horária mínima de duas horas.
A formação acadêmica de intérpretes também ganha impulso. Existem dois cursos superiores de formação de intérpretes de Libras, um na Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, e outro na Universidade Metodista de Piracicaba (SP), ambos com duração de dois anos. Disciplinas teóricas e práticas fazem parte do conteúdo programático. "Os alunos são incentivados a conviver com a comunidade surda para haver inserção deles no contexto social. Busca-se, também, um diálogo com tradutores e intérpretes de línguas orais, que, por serem profissionais reconhecidos socialmente há muito tempo, podem contribuir com suas práticas na formação dos profissionais da língua de sinais", explica a coordenadora e docente do curso de Piracicaba, Ana Claudia Balieiro Lodi.
Proposta apresentada na Conferência dos Direitos e Cidadania dos Surdos, em 2000, e referendada em 2005, defende que a formação deve ser parte do curso de graduação de letras - tradutor e intérprete, com duração de cinco anos. "Esperamos que todas as universidades que mantêm cursos de letras possam oferecer essa formação, que acena para um mercado de trabalho promissor", comentam Maria Inês da Silva Vieira e Ricardo Nakasato, coordenadora do Programa de Libras da PUC-SP e professor de Libras da instituição.
Nessa mesma conferência, foi apresentada uma reivindicação antiga da comunidade surda. A implantação de uma central de intérpretes no estado de São Paulo, mantida pelo poder público, que funcionaria 24 horas para ajudar pessoas com surdez em diversas situações - em hospitais e repartições públicas, por exemplo - constituindo-se numa ferramenta de integração. Já existe uma central em funcionamento em Minas Gerais, financiada pelo governo mineiro.
Os profissionais que já atuam como intérpretes terão uma grande oportunidade para formalizar sua situação quanto à formação acadêmica. O MEC, em conjunto com entidades ligadas à comunidade, entre elas a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos, realizará em agosto - e pelos próximos dez anos -, exames de proficiência em interpretação de Libras/Língua Portuguesa. Os aprovados terão direito a diploma e serão considerados aptos a bater a porta do mercado de trabalho como qualquer outro profissional de formação superior.
Não se sabe exatamente qual o número de intérpretes de Libras que atuam no país. Nenhum dado estatístico foi levantado nesse sentido até agora. A falta de informações confiáveis impede desenhar o mapa desta carreira e, conseqüentemente, dimensionar que regiões do Brasil estão bem servidas de intérpretes de Libras e quais necessitam de profissionais. O que se sabe é que existe uma grande concentração de profissionais no Sul e Sudeste, e que há uma previsão do MEC de que 2.000 a 3.000 pessoas farão o exame. Informações desencontradas são mais uma característica de um segmento que está se organizando ao mesmo tempo em que se expande. Porém, se faltam informações que permitam tirar conclusões há consenso de que a demanda por este profissional está muito além da oferta. O mercado de trabalho está abertíssimo, embora não existam vagas do ponto de vista formal. Mas elas serão criadas. Tornar-se um intérprete de Libras já pode ser garantia de um futuro promissor.
http://www.vezdavoz.com.br/2vrs/noticiasview.php?id=38
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